Lucerna quer abolir celibato de padres
Católicos de Lucerna assumem posição revolucionária: eles votaram pela abolição do celibato dos padres e pelo acesso das mulheres ao sacerdócio.
O sínodo cantonal adotou uma declaração que será transmitida em breve à Conferência dos bispos suíços.
Por 73 votos contra sete, e nove abstenções, o sínodo – o parlamento da igreja de Lucerna – adotou um texto que será transmitido ainda esse ano à Conferência dos bispos suíços (CES), a maior autoridade católica romana do país.
Porém é improvável que a CES aceite a declaração. Caso isso ocorra, essa posição poderá ser considerada uma verdadeira revolução na igreja católica.
Sabe-se que o Vaticano é totalmente contrário à propostas que coloque em risco o celibato para padres e o impedimento da ordenação de mulheres.
Porém já existe oposição dentro da Igreja. “Trata-se não apenas de abolir o celibato para padres”, explica Paula Beck, porta-voz do sínodo de Lucerna. “Se um padre, que tiver o direito de se casar, decidir por não fazê-lo, sua escolha terá ainda mais valor”.
Quanto à interdição das mulheres como padre, Paula Beck julga discriminatório esse tabu. “Não existe nenhuma lei divina que proíbe as mulheres de exercer o sacerdócio”.
O amor de uma mulher
A abolição do celibato poderá mudar radicalmente a vida de alguns padres católicos.
“Existe um grande número de padres que mantém relações secretas. Porém muitos fiéis próximos a essas pessoas fazem vista grossa”, declara Ciril Berther, 65 anos, ex-padre forçado a abandonar a batina devido ao seu relacionamento com uma mulher.
“Eu vivia um caso proibido com a minha atual companheira”, conta o ex-padre. “Os membros da minha paróquia aceitavam o fato. Depois que ele se tornou público, fui obrigando a abandonar a Igreja”.
Um colega de Ciril Berther levou o caso diretamente ao bispo, que qualificou a relação como “uma história vilã”. Cinco anos depois da expulsão, o ex-padre afirma não ter se arrependido da decisão de abandonar a batina.
“Para mim a Igreja faz coisas magníficas no mundo, porém desde que eu descobri o que é o amor por uma mulher, passei a valorizar também esse tipo de sentimento”.
Vida em família
Ruth-Gaby Vermot-Mangold, deputada federal socialista, também já viveu uma história semelhante: seu marido, Jean-Marie, abandonou o sacerdócio há trinta anos para se casar com ela.
“Nós nos conhecemos em Togo, na África, se lembra a parlamentar. Na época, a Igreja criticava seu marido por não estar convertendo um número suficiente de pessoas”.
Depois de dois anos passados no país africano, onde o relacionamento dos dois não chegou a constituir um problema, o casal retornou à Basiléia, na Suíça.
“Então a vida começou a ser bem dura conosco”, se lembra Ruth-Gaby. “Meu marido foi excluído da Igreja católica e da vida que ele criou para si nessa época. E nós não tínhamos nenhum tostão”.
O casal escreveu então uma carta ao Vaticano, confessando o relacionamento. Ruth-Gaby lembra que a resposta obtida chocou-os profundamente.
“Nós ainda guardamos essa carta”, conta a deputada. “Ela nos condenou, de uma forma que eu considerei desumana. A Igreja também não deu nenhuma indenização ao meu marido, apesar dos seus mais de 20 anos de trabalho por ela”.
Mulheres na Igreja
Apesar da forte oposição, ainda existe uma Igreja católica que aceita o casamento de padres e, até mesmo, desde 1999, a ordenação de mulheres. Trata-se da “Igreja Católica Cristã”, fundada em 1870 em reação ao Concílio do Vaticano I, que proclamou a infiabilidade do Papa.
Ordenada no cantão de Solothurn em fevereiro de 2000, Denise Wyss foi a primeira mulher padre na história da Suíça. Sua ascensão ao sacerdócio não deixou, porém, de provocar uma forte oposição de alguns colegas masculinos.
“Para algumas pessoas na Igreja, Jesus era um homem. Por isso eles acreditam que o padre, que afinal o representa frente ao altar, deve ser também um homem”, explica Daniel Konrad, padre católico cristão.
“Ao mesmo tempo existem aqueles que argumentam: - Jesus, no final da sua vida, transformou-se num ser humano. Por isso, qualquer ser humano está apto a lhe representar, desde que sua formação seja idônea”, conclui o padre Konrad, para defender sua colega de batina.
swissinfo, Billi Bierling
tradução de Alexander Thoele
Breves
- A Igreja católica romana não admite nem o casamento de padres, nem a ordenação de mulheres.
- A Igreja católica cristã foi fundada em 1870, como reação ao dogma da infiabilidade papal.
- Existem 12 mil católicos cristãos na Suíça e 500 mil no mundo.
- Ordenada em fevereiro de 2000, Denise Wyss é a única mulher padre da Suíça.
- As religiões na Suíça (recenseamento de 2000)
Católicos romanos: 44,1%
Protestantes: 36,6 %
Islãmicos: 4.5%
Ortodoxos: 1,2%
Outros: 1,9%
Ateus: 11,7%

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