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O modernista que descobriu o Brasil

Blaise Cendrars e seu gato em junho de 1960. Keystone

O escritor suíço Blaise Cendrars (1887-1961) foi uma personalidade do front das vanguardas. Viajante inveterado, natural de La Chaux-de-Fonds, cantão de Neuchâtel, viveu nos Estados Unidos, na Rússia e chegou a se naturalizar francês, mas a forte conexão com o Brasil tem traços significativos em uma parcela importante de sua obra, parcialmente traduzida para o português.

Este conteúdo foi publicado em 11. novembro 2012
Heloísa Broggiato, swissinfo.ch

Conhecido hoje como grande poeta modernista , Cendras alistou-se como voluntário na Legião Estrangeira, foi combatente na primeira Guerra Mundial e perdeu o braço direito. Nessa época ele já havia escrito o poema Prosa do Transiberiano, obra na qual narra a viagem a São Petesburgo. O trabalho foi ilustrado pelas aquarelas de Sonia Delaunay.

Segundo Graziella Beting,  jornalista e doutoranda em História da Imprensa pela Universidade de Paris II, Cendrars atuava em várias frentes. Era poeta editor, designer gráfico, entre outras atividades. “ Ele foi um dos primeiros a ver o livro como objeto, fazia croquis das capas de suas obras, com a mão esquerda”, conta a pesquisadora.

Nos anos anos 20 Cendrars vivia em Paris, cansado do engessamento do dadaísmo e do surrealismo, quando conheceu artistas brasileiros Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade.

Pauliceia

Desde o momento desse encontro até a primeira temporada do escritor em São Paulo foi um pulo. Desembarcou no Brasil com uma máquina de escrever e a cabeça cheia de projetos. Veio respirar o ar dos trópicos.

O deslocamento rendeu Feuilles de Route, o diário de viagem escrito em 1924, que narra o impacto do autor na chegada ao Brasil, e conta com ilustrações de Tarsila do Amaral. “Cendrars tinha projetos para espetáculos de dança e filmes de propaganda sobre o Brasil”, conta Graziella Beting.

“Ele desembarcou no Brasil como grande poeta modernista, dava entrevistas, palestras e dava a entender que era mais valorizado aqui do que França”, completa.

Inspiração e pão de queijo

Depois da destruição provocada pela primeira Guerra Mundial, o Brasil representava para Cendrars um lugar mais do que inspirador. “Era um país onde a fé no progresso coexistia com a fé em algo mágico”, explica Jeroen Dewulf, professor de Germanística da Universidade da Califórnia, em Berkeley e também autor de publicações sobre as relações entre Cendrars e o Brasil.

“O Brasil deu a Blaise Cendrars uma chance para que resgatasse e até radicalizasse um programa intelectual que corria o risco de se tornar obsoleto”, diz. “Ele não apenas definia o Brasil como um país que não pertencia a ninguém, como se identificava como brasileiro disposto a abandonar a Europa física e intelectualmente, para construir uma nova identidade nos trópicos”, completa Dewulf.

Cendrars viveu no Brasil um momento único, a Semana de Arte Moderna, de 1922, momento de grande efervescência cultural. Tinha uma lista estrelada de amigos da intelectualidade paulistana, que incluía o pintor Di Cavalcanti, o escultor Victor Brecheret, o escritor Sérgio Milliet, entre outros, além de contar com o apoio do mecenas Paulo Prado, cafeicultor, investidor e também escritor.

Nessa temporada no Brasil, Cendrars, incentivado pelos modernistas fez uma viagem a Minas Gerais e se impressionou com a obra de Aleijadinho. Em um momento em que a intelectualidade brasileira se recusava a seguir modelos clássicos europeus considerados “passadistas”, Cendrars viu na arte barroca mineira algo genuinamente brasileiro.

Depois da viagem, Oswald de Andrade escreveu o Manifesto Pau Brasil, publicado pela editora de Cendrars sob o título Au Sans Pareil, documento que apresentava noções estéticas que iriam nortear a produção dos modernistas no Brasil. O volume foi dedicado ao poeta suíço: “A Blaise Cendrars, por ocasião da descoberta do Brasil”.

Valores

Para Graziella Beting, a conexão mais importante entre Cendrars e o Modernismo brasileiro foi o fato de o escritor ter sido o grande incentivador do movimento ligado às bases autenticamente brasileiras e a adoção de uma nova posição em relação aos modelos europeus. Como consequência, Oswald publica o Manifesto Antropofágico, em 1928, reafirmando os valores próprios da cultura brasileira.

Assim como Cendrars era um europeu festejado no Brasil, alguns brasileiros faziam sucesso na Europa, graças à agitação cultural feita por ele. O relacionamento profissional entre Cendrars e Tarsila rendeu frutos. “A primeira exposição de Tarsila foi realizada em Paris, em 1926, montada com apoio e orientações de Cendrars”, conta Graziella. “Seus quadros mais importantes foram produzidos nesse período”, acrescenta.

Passada a euforia modernista Cendrars passou a se dedicar a atividades jornalísticas, foi correspondente de jornais franceses e escreveu suas memórias. Um dos volumes Loteamento do Céu, foi lançado no Brasil pela editora Companhia das Letras. Jeroen Dewulf conta que o Brasil sempre representou para o escritor a Terra da Utopia.

Cendrars e o Brasil

O Brasil foi importante para Cendrars em quse toda a produção a partir de 1924:


Feuilles de Route (1924),

Moravagine (1926),

Une nuit dans la forêt (1929),

Aujourd’hui (1931),

Histoires vraies (1937),

La Vie Dangereuse (1938),
D’Oultremer à Indigo (1940),

Le Lotissement du Ciel (1949),

Trop c’est trop (1957)

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"Um dos maiores poetas franceses do século XX"

Blaise Cendrars, pseudônimo de Frédéric Louis Sauser (La Chaux-de-Fonds, cantão de Neuchâtel, Suíça, 1 de setembro de 1887 — Paris, 21 de janeiro de 1961) foi um novelista e poeta suíço, tendo escrito em língua francesa.

Tendo uma vida itinerante, o que se reflete em sua poesia, basicamente escritos de viagem, visitou o Brasil na década de 1920 do século XX, influenciando diversos artistas e escritores do modernismo brasileiro e sendo também influenciado por Oswald de Andrade, com cujos poemas da Poesia Pau-Brasil seus poemas mais curtos, de construção cubista, apresentam forte semelhança formal e no gosto pelo primitivo. Nessa incursão, se interessou pela mente doentia do criminoso Febrônio Índio do Brasil, sobre quem escreveu artigos em jornais e um capítulo de livro.

Autor também de poemas mais extensos que do seu aparentado poeta brasileiro, como a "Prosa do Transiberiano", foi sempre fiel, em poesia, ao seu estilo "literatura de viajantes", sendo este um longo poema realmente prosaico, feito a partir de reminiscências, que lembra a posterior obra de Allen Ginsberg.

Mesmo sendo Suiço de nascimento, é considerado por Paul Eluard como um dos maiores poetas franceses do século XX.

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